Guihgo


onerb: Quando você percebeu que gostava de escrever e cantar?

Guihgo: Desde os 12 anos eu já criava composições, mas foi com os 14 que comecei a fazer disso uma forma de me expressar efetivamente, cantava numa banda de Hard Core, onde fiquei por um ano compondo, ensaiando, e tocando esporadicamente em festivais de Rock.
Com o tempo aquela coisa toda começava a degringolar pra uma linguagem diferente, e comecei a entender que o que eu fazia era maior do que a caixa onde eu tinha resolvido me colocar.
Descobri a arte Drag , fiz shows por quase todos os estados do Brasil, ganhei concursos e levei o meu Drag pra um público de quase 13 mil pessoas , foi aí onde entendi que o palco era meu lugar, e cantar era parte disso. 

onerb: Qual a parte mais difícil de fazer trampo independente?

Guihgo: A parte mais difícil é ENTENDER, é entender que não se pode fazer nada sozinho (sobretudo quando se é uma pessoa extremamente complexa e independente).
É entender que as vezes você estará nadando contra uma corrente gigantesca cheia de tubarões prontos pra abocanhar seu estilo, suas referências, seus ideais e transforma-los em entretenimento barato.
É entender que, uma vez que você está nesse corredor estreito, 99 portas vão se fechar pra que uma fresta se abra pra você, e você terá de se reinventar milhões de vezes dentro desse mesmo lugar.

onerb: Quando você se entendeu como negro? 

Guihgo: Essa é uma questão bastante delicada.
Cresci numa casa onde o preconceito nunca passou dá porta de entrada, e isso eu confesso que foi meu principal alicerce, tenho um pai extremamente anarquista, totalmente fora dos padrões e pasmem (branco), e ele sempre me ensinou que toda e qualquer forma de preconceito era ignorância e que não deveria se quer me questionar. Não que isso me impedisse de passar por todos os tipos de barreiras fora, mas me fortaleceu pra suportar.
Ser negro me fazia especial, me fazia mais importante, me fazia melhor, e foi isso que aprendi em casa desde pequeno.
Quando me vi na rua passando por qualquer dificuldade por conta dá minha cor de pele já não era mais um problema pra mim, era um desafio, e eu adoro desafios, e então, pra cada olhar torto, ou desviada na rua, que me davam, eu me sentia mais vitorioso, por que via sempre a ignorância dos outros correndo de alguém que sabia demais a respeito de si mesmo.

onerb: Quais são suas principais fontes de inspiração?!

Guihgo: Eu confesso que com a explosão de artistas que tem ganhado exposição em nosso cenário aqui no Brasil, seria injusto dizer que como no início ainda me inspiro em artistas de fora, ciente dá quantidade de artistas que ainda precisam ser apresentados pra nossa galera seria ridículo não citar nomes como as manas do Rio que tem feito um trabalho absurdo de lindo Rothier, Marvin, Lauro, ou não falar dá Banda Recalque, Caio Prado, Xerxes, nem preciso apresentar Gloria Groove, Murillo Zyess, Tflow e Vennus Mc.
Todos são artistas tão bons e talentosos quanto qualquer outro dos artistas que foram influências no início do meu trabalho, acontece que hoje aquelas inspirações já não fazem mais tanto sentido, existe representatividade em meu país, artistas maravilhosos que precisam ser citados, precisam ser vistos e ouvidos.
Essas manas hoje em dia são o real sentido de fazer o que faço.
E tenho muito orgulho em tê-los como amigos e parceiros nessa loucura toda.

onerb: Você pensa na possibilidade de viver apenas como cantor? Se já vive/sobrevive como é?!

Guihgo: Pensar eu penso todos os dias rsrs, ainda é muito complicado mas a passos curtos e de forma honesta eu conquisto meu espaço. Pra falar a real eu nunca desejei grandes fortunas, só o suficiente pra conseguir entregar QUALIDADE no que faço e me proporcionar conforto.
A verdade é que quando você opta por ser coerente com o que escreve, acaba traçando uma batalha gigantesca com o resto do mundo. Eu nunca fui o tipo de artista que vive de CLOSE, e vende aquilo que nem tem condições de pagar.

onerb: Representatividade é importante, e nós sabemos muito bem disso, mas como você sente que a mídia tem tratado isso?

Guihgo: O que eu acho é que ainda existe muito a ser discutido, e cabe a nós mesmas a disposição para ser em certos aspectos didáticos.
Nós vivemos por séculos num mundo extremamente quadrado, sem espaço pra qualquer questionamento, e tem acontecido uma mudança de dentro pra fora que necessita de tempo e espaço pra que os acomodados mudem.
E não é a mídia que tem feito isso, não são 5 minutos na TV que tem feito as pessoas discutirem sobre assuntos relevantes.
Tudo isso é fruto de muita resistência, fruto de tantas manas que deram e continuam dando a cara a tapa nas ruas pra fazer com que uma de nós ganhe esses 5 minutos suados.
O que eu acho é que a mídia não é responsável por nada disso, nada dessa mudança,   os responsáveis somos nós, eles só estão entendendo que somos maiores e se não nos apresentarem dignamente a sociedade, nós vamos arrumar um jeito de fazer isso, ocupando os espaços, nos fazendo visíveis, definitivamente nos representando por nós mesmas, sem nenhum porta voz sem conhecimento de causa.


onerb: E chegamos ao fim de mais uma entrevista, que foi maravilhosa! E pra terminar da melhor forma possível Gu1hgo deixa uma mensagem pra você que quer começar um trampo independente e tem aquele receio/medo, se inspirem e se TORNEM ÚNICO, ONERB. 

Guihgo: Faça, seja, comece, e se não for por você que seja por outras tantas pessoas que precisam de exemplos como você.
A gente tem tão pouco pra levar e tanto a oferecer.
Seja honesto com o que sente e não sinta nenhuma necessidade em ser coerente, se fizer sentido pra você.

A gente não escolhe mudar, a gente nasce mudança.

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