Brendon Reis


onerb: Quando você entendeu o que era ser negro no Brasil?

Brendon Reis: Entre 2015 e 2016, com 18 anos. Nessa época eu estava namorando uma pessoa branca de classe média. Eu fui percebendo o que é ser negro no Brasil especialmente pelo tratamento deles comigo; se não fosse essa experiência, eu não teria me questionado, eu não teria chegado a uma conclusão com ajuda da internet e dos livros. Teve um dia que estava com a chave da casa dessa pessoa, ela estava viajando a trabalho e pediu para mim alimentar os dois cães, já que eu trabalhava ali perto. Só que nessa época eu também estudava, ou seja, meu dia era corrido. Nessa correria, após alimentar os cães pela manhã e no almoço, meu celular descarregou, desligou, e eu só consegui colocar ele na tomada pela noite. Quando liguei ele, havia dezenas de ligações dessa pessoa que eu me relacionava a mais de oito meses, havia um monte de mensagens desesperadas perguntando ‘onde eu estava’. Na hora eu liguei e disse que estava ali, que tudo estava bem, que meu dia tinha sido corrido, mas, sim, havia cuidado das cachorras. Eu ouvi a seguinte frase: “Nossa, fiquei preocupado com minha casa. Eu liguei para o sindico para ver se tinha alguém lá e nada. Liguei para todo mundo, seu celular só dava caixa postal. Eu pensei que você tinha roubado minha casa inteira e sumido. A minha TV vale uma fortuna... e a decoração?”. Fora os outros comentários rotineiros. “Seu cabelo já está crescendo, já tá começando a ficar duro, tá na hora de raspar; mas não raspa muito se não fica parecendo detento”, “os negros realmente fedem mais que os outros”.

onerb: Qual sua maior dificuldade enquanto artista independente?

Brendon Reis: A pobreza. Todos que tem um pingo de bom senso, sabem o quanto isso é limitador para mentes criativas. É como se a concretização de planos e, talvez, o reconhecimento estivesse num patamar muito alto, pelo menos em vida, sendo que no inicio você não tem dinheiro pra comprar material para construir os degraus para chegar lá.

onerb: Em que momento você percebeu que gostava de desenhar e quando passou a apenas desenhar pessoas negras?

Brendon Reis: Nunca gostei de desenhar, embora desde cedo tivesse grande facilidade. Fora que nunca fui encorajado a usar/aperfeiçoar esse dom, pelo contrário, sempre me disseram para não seguir carreira artística porque ‘‘paga pouco’’. Não desenho apenas pessoas negras, também faço paisagens. E eu passei a estabelecer essa prioridade quando percebi que poucos preferem representar pessoas negras em sua arte. Frequentar os museus e galerias convencionais só me mostrou que o lugar da arte de e com pessoas negras é só no museu Afro Brasil. Isso é errado. Então, pensei: já que ninguém nos prioriza, vou contrariar isso.

onerb: Você tem apoio financeiro e/ou moral da sua família, enquanto artista?

Brendon Reis: Financeiro apenas quando solicito, mas evito pedir pois temos um orçamento escasso. Apoio moral eles sempre dão, minha mãe adora. Tem um quadro imenso que fiz do Kendrick Lamar que ela sonha em pendurar na sala de casa, mesmo sem saber quem ele é.

onerb: Quais são suas inspirações?

Brendon Reis: Sou do time de artistas que não tem inspiração, só um objetivo em comum chamado responsabilidade que é sentar e produzir algo.

onerb: Você pensa em apenas viver da sua arte? Ou vê apenas como hobbie?

Brendon Reis: Talvez. Ninguém sabe das reviravoltas que a vida dá. Mas futuramente apenas vejo isso como uma segunda atividade econômica. Eu quero ir para universidade estudar administração pública e depois exercer a profissão.


onerb: E chegamos ao fim de mais uma entrevista maravilhosa e o Brendon vai deixar uma mensagem pra vocês que desejam começar algum trampo independente e tem aquele medo/receio. Se inspire e SE TORNE ÚNICO, ONERB. 


Brendon Reis: Arrisquem. A insegurança é algo que ao mesmo tempo nos paralisa, nos atrasa, e nos protege. É preciso saber quando você está paralisado em um lugar ruim ou protegido num local confortável para assim catalisar esses receios e transforma-lo em aprendizagem.

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